Uma comitiva multitemática, capitaneada pelo coordenador da Comissão de Acompanhamento do Sistema Penitenciário (CASP) – Comissão de Direitos Humanos da OAB-GO, Gilles Gomes, realizou visitas técnicas para inspecionar as carceragens das unidades prisionais de Caldas Novas e de Itumbiara.
Também integram esse grupo de trabalho o vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos (CDH), André Vinicius Dias Carneiro; as advogadas integrantes da CDH Ana Claudia Alves da Silva, Maria de Lourdes Silva (também representando a Assembleia Legislativa de Goiás), Sarah de Almeida Ferreira Neves e Thaline Ayres Marques; Fabiano Lima Dias, da Comissão de Segurança Pública (CSP), e Eder Porfiro Muniz, membro da Comissão de Direitos e Prerrogativas (CDP).
Gilles explica que o intento é verificar in loco uma série de fatores, como as condições de permanência dos presos, condições de trabalho oferecidas aos servidores, armamento, acesso à Justiça. “O objetivo é nos municiarmos com o máximo de informações possíveis. A partir destes dados coletados, a OAB Goiás irá elaborar um relatório que servirá de embasamento para uma audiência pública que pretende mobilizar diversos segmentos da sociedade civil. Não queremos fazer promessas vãs. Queremos conhecer melhor os problemas e avaliar até que ponto nós poderemos agir, no sentido de cobrar providências efetivas”, reforça.
Ao longo de todo o dia, o grupo se desdobrou para ouvir cada uma das demandas nas unidades visitadas. A cada cela, as reclamações pareciam se repetir: desde a comida, de péssimo aspecto e sabor intragável, até mesmo denúncias de maus tratos. Da falta de remédio para a dor de cabeça, à ausência de espaço adequado para receber a família no dia de visita. A grade separa em lados opostos dois universos completamente distintos. Mas ambos, por um momento, compartilhavam do calor quase que insuportável, agravado pelo espaço disputadíssimo nos poucos mais de 15 m2 de cada uma das celas. Celas com estrutura para receber de 3 a 6 presos, mas que comportam 10, 14, 23 pessoas. De dentro delas, ecoa o grito sem face, em meio a tantas delas: “Isso aqui, amigo, é desumano!”
Caldas Novas
A primeira ronda do dia foi na Penitenciária de Caldas Novas. Com capacidade original para 150 vagas, a unidade comporta atualmente 326 detentos, sendo 293 homens e 33 mulheres, divididos nas alas A, B, C, D, triagem, ala feminina e módulo de respeito. Agente prisional há 6 anos, Luciano Martins Veloso assumiu a direção da unidade há uma semana. Mas mesmo pouco tempo à frente da administração da cadeia, ele já pode constatar alguns percalços. “O fato de ser numa região residencial e dentro da cidade nos traz problemas”.
Os servidores que atuam no presídio de Caldas Novas também apontaram uma série de deficiências, como a falta de munição, que muitas vezes precisa ser adquirida com o dinheiro que sai do bolso do próprio funcionário. Salários baixíssimos e falta de cursos de capacitação foram outras das queixas mais ouvidas. A falta de viaturas para levar os presos para uma unidade de saúde também foi apontada, bem como a própria carência nos quadros da unidade. “Já houve casos em que ficaram três agentes para cuidar de um presídio com mais de 300 presos. Isso é um absurdo!”, reclamou um deles.
O presidente da Subseção de Caldas Novas, Andrei Aparecido Ribeiro de Souza Barbosa, esteve no local e saudou a iniciativa da seccional, direcionando as congratulações ao presidente Lúcio Flávio e ao presidente da CDH, Roberto Serra. “É importante para demonstrar uma realidade carcerária, não só de Caldas Novas, mas de todo o Estado de Goiás, e despertar a atenção das autoridades. Em nosso caso especificamente, é uma realidade preocupante. O presídio está superlotado, as instalações estão aquém do razoável e, principalmente, o material humano está escasso para a quantidade de presos. A OAB pode unir forças com outras entidades, como Ministério Público e Poder Judiciário, para cobrar melhorias para nossa unidade, seja ampliando a atual, seja pleiteando a construção de uma nova, dentro da realidade da cidade de Caldas Novas”, afirmou Andrei.
Itumbiara
Com 414 internos se espremendo nas 257 vagas disponíveis, a Unidade Prisional em Itumbiara repete os mesmos problemas. Mesmo procedimento, as mesmas constatações: condições totalmente indignas, ausências de estrutura adequada, profissionais mal remunerados e sem estímulo. O relato foi dado inicialmente pelo diretor da unidade, Fabio Alex Trindade da Silva, e corroborado pelos agentes. Fábio se ressente por não ter condições de melhorar a situação do presídio, até mesmo para aliviar o clima de tensão. “O preso acha que nós é que somos os culpados pelo que acontece aqui. Tentamos fazer o possível, mas nem tudo está a nosso alcance”, lamenta. O presidente da subseção de Itumbiara, Márcio Rodrigues Vieira, se colocou à disposição para acompanhar e apoiar a comissão.
Uma queixa recorrente entre os internos, além das já habituais, é a falta de oportunidades de trabalho e estudo. “Ficamos o dia inteiro aqui, sem fazer nada. E a cabeça da gente, vira o quê?”, questionava um jovem detento do bloco II da unidade, considerado um dos mais problemáticos. Na ala feminina, na cela 15, o pedido era de Jaqueline Martins: “Quero trabalhar! Vejam algo para mim”. Esta, dentre tantas centenas de outras de reinvindicações, que partem de dentro ou fora das celas, mostram que o trabalho é imenso, quase que “de formiguinha”, mas que precisa urgentemente ser feito. “Não viemos aqui para fazer promessas. Promessas não vão resolver os problemas de ninguém. Viemos conhecer melhor os problemas para, unindo as forças possíveis, tentar resolvê-los”, afirma Gilles.
(Texto: Marília Noleto – Assessoria de Comunicação Integrada OAB-GO)