Nesta quarta-feira (17), o presidente da OAB-GO, Miguel Ângelo Cançado, discursou na solenidade de posse da juíza Amélia Netto Martins de Araújo no cargo de desembargadora do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJ-GO).
A seguir, confira a íntegra do discurso:
Há vinte anos era promulgada a Constituição que Ulisses Guimarães cunhou de cidadã. Então, neste momento em que o Pleno do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás se reúne, recebendo as autoridades mais elevadas do Estado, para dar posse à magistrada Amélia Netto Martins de Araújo, devemos todos nos perguntar: o que mudou no Brasil nestas duas décadas de pleno exercício das liberdades democráticas?
E, muito além desta indagação, devemos refletir sobre o papel que, ao longo dos anos, vem desempenhando o Poder Judiciário brasileiro, e aqui é o foro mais apropriado para encetar este debate.
Como advogado e, sobretudo, como cidadão, tem me chamado a atenção a postura adotada pelo Supremo Tribunal Federal de se inserir nos grandes debates nacionais. Até a bem pouco tempo, o STF era uma corte conhecida só por nós integrantes das carreiras jurídicas, hoje, ao contrário, vemos todos os dias as páginas dos jornais e das grandes revistas estamparem a atuação da Suprema Corte, não raro com a tomada de decisões que geram polêmica.
De qualquer maneira, Sras. e Srs. Desembargadores, este novo perfil da cúpula do Judiciário brasileiro deve ser seguido como um modelo para as demais instâncias do Poder. Vale dizer, esta aproximação, esta importante visibilidade que o STF está dando, há de ser adotada também pelos Tribunais de Justiça, principalmente pela sua importância para o contexto político e social de cada estado da federação.
Ao Poder Judiciário caberá, certamente, não só a postura inerte de solucionar conflitos de interesses, sua dimensão vai muito além disto, como tem mostrado o Supremo. Segundo a concepção legal e doutrinaria brasileiras, a jurisdição é inerte. No entanto, a ordem constitucional estabelecida a partir de 1988 fez com que o cidadão brasileiro, e o próprio Estado, passassem a bater cotidianamente às portas do Poder Judiciário.
É neste contexto que a Desembargadora Amélia Netto está assumindo o cargo para o qual ascendeu por merecimento.
A lógica e a dinâmica que vêm se estabelecendo nos levam a pensar até na quebra do princípio da inércia, ou seja, o Poder Judiciário dos novos tempos será cada vez mais ativo social e politicamente.
Portanto, para todos nós os tempos atuais se mostram desafiadores, que bom que assim seja!
Paradoxo, talvez seja esta a palavra que melhor reflita a situação que vivenciamos. Alguns exemplos: a economia mundial parece estar a um passo de um verdadeiro colapso, crise que, segundo as autoridades monetárias brasileiras não nos atingirá na mesma proporção e, por outro lado, as desigualdades sociais no Brasil se mantêm em níveis alarmantes.
Ainda nessa linha dos paradoxos, podemos situar o fato de que vivemos sob absoluta estabilidade política, de plena garantia das liberdades democráticas, ao contrário de alguns vizinhos do Mercosul. Ainda assim, nos ronda o temor da existência de um a estado policial, ou policialesco, no qual o direito de defesa tem sido freqüentemente cerceado.
A Constituição Federal tem sido violada absurdamente, com o não cumprimento dos princípios básicos da cidadania, sem falar no desrespeito ao Estado democrático de Direito, ameaçado pelo arbítrio da bisbilhotice, que chegou até aos ambientes da mais alta corte de Justiça do País: o Supremo Tribunal Federal.
Nunca antes uma constituição brasileira havia reconhecido expressamente o advogado como indispensável à administração da justiça e – que paradoxo! – e também nunca precisamos lutar tanto para fazer valer nossos direitos e prerrogativas profissionais, e vamos continuar a fazê-lo.
Ao contrário da vizinha Bolívia, não vivemos a iminência de uma guerra civil, por isso, é absolutamente paradoxal reconhecer que os números da violência urbana, as mortes no trânsito e o tráfico de drogas nos apresentam estatísticas de guerra. E, o que é mais grave, as principais vítimas são os jovens.
Romper estes paradoxos é a nossa principal tarefa, a responsabilidade é de todos nós que estamos aqui hoje para homenagear e saudar a nova desembargadora.
O grande desafio que ora se impõe à ilustre empossada é o de dar a sua contribuição, na luta por um princípio básico de extrema importância para a sociedade: tornar célere a prestação jurisdicional.
A enraizada cultura da impunidade é um dos fatores que alimentam a criminalidade. E combater esse mal, com certeza, é parte da vossa relevante participação nesse projeto de País efetivamente mais justo, ilustre Desembargadora Amélia Netto Martins.
Numa outra seara, no instante em que a OAB-GO está em processo de elaboração de lista sêxtupla para preenchimento da vaga aberta com a aposentadoria do Desor. Charife Oscar Abrão, é rigorosamente relevante manter a consciência de todos sobre a importância do quinto constitucional para a manutenção do verdadeiro sentido de Justiça.
A presença de representantes da advocacia e do ministério público na composição dos tribunais aprimora a entrega da prestação jurisdicional, por diversos fatores, mas, em especial, por permitir, que a vivência de cada carreira seja trazida às cortes de justiça.
De nossa parte, a vivência da advocacia e a do próprio cidadão. E a consciência e a sensibilidade democráticas do legislador ao instituir o instrumento na Carta Magna precisam ser resguardadas.
Tenho convicção que esse é o pensamento deste Tribunal que, por meio de seu Presidente, desembargador José Lenar de Melo Bandeira, um digno integrante do chamado quinto constitucional, tem sabido reconhecer a importância da advocacia, estabelecendo importantes parcerias com a OAB Goiás, a exemplo do projeto de implantação do Projudi nas Comarcas do Estado e ao se abrir para o diálogo constante, recebendo críticas e sugestões da Seccional.
Nesse sentido, a OAB Goiás comemora conquistas relevantes junto ao Tribunal de Justiça e ao Foro da Comarca de Goiânia no seu empenho constante de defender os direitos e prerrogativas da advocacia. E aproveito, nesse momento, para enaltecer a brilhante atuação do diretor do Foro, Juiz Carlos Alberto França.
Enfim, prezadas e prezados, finalizo minha saudação à excelentíssima desembargadora Amélia Netto, enaltecendo seus méritos ao ser escolhida para o cargo.
Sua trajetória de merecido sucesso ganha agora uma nova dimensão, por isso já se pode antever que a firmeza e a seriedade na função de julgar continuarão a marcar a atuação de Sua Excelência nesta Corte. Parabéns Desembargaora Amélia Netto e a seus familiares, que contribuíram para que chegasse a este momento.
Tenho convicção que este Tribunal se renova positivamente com a chegada de Vossa Excelência, que muito tem a contribuir com a Justiça do nosso Estado.
Endereço também minhas deferências à desembargadora aposentada Juraci Costa, que deixou o Pleno em julho deste ano.
Obrigado e forte abraço a todos!
17/9 17h