“Benefícios de geração de renda e o princípio da isonomia”, por Tatiana Aires Brito

23/08/2012 Artigo, Notícias

Confira o artigo Benefícios de geração de renda e o princípio da isonomia, da presidente da Comissão de Direito Previdenciário e Securitário da OAB-GO, Tatiana Aires Brito, publicado na edição desta quinta-feira (23), do jornal Diário da Manhã.

A Constituição Federal dispõe que"a assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivo a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei."

Tendo em vista o disposto na Constituição Federal, foi criado o benefício de prestação continuada (BPC), atualmente conhecida como Loas (Lei Orgânica de Assistência Social). Os requisitos para a concessão deste benefício encontram-se insertos no art. 20 da Lei, que traz o conceito de deficiência e a aferição de miserabilidade. Vejamos:

"§2º Para efeito de concessão deste benefício, a pessoa portadora de deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho.”

"§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a ¼ (um quarto) do salário mínimo."

Quando se conceitua a deficiência da forma como se encontra descrito no parágrafo acima, temos que a deficiência seria de tal forma grave que impediria as atividades mais elementares da vida diária, o que não condiz com o objetivo da lei, que é garantir os mínimos sociais para quem não tem como contribuir para a Previdência Social e encontra-se à margem da sociedade.

É bom lembrar ainda que a Constituição Federal não faz nenhuma ressalva com relação à incapacidade ao assegurar a assistência aos deficientes, assim como a jurisprudência, que abrandou o conceito de deficiência por entender que, da forma como a lei previa, um grande contingente de pessoas não teria acesso ao benefício, ferindo sobremaneira o objetivo da Assistência Social

Com relação ao conceito de miserabilidade, temos que para fins de concessão do benefício o núcleo familiar terá que comprovar renda per capita igual ou inferior a ¼ do salário mínimo, sob pena do benefício não ser deferido. Estamos falando que cada pessoa do grupo familiar não poderá ganhar mais do que R$ 155,50 (cento e cinquenta e cinco reais e cinquenta centavos) por mês ou R$ 5,18 (cinco reais e dezoito centavos) por dia.

Importa saber que no caso do núcleo familiar onde um dos integrantes recebe o benefício assistencial, este não poderá integrar o cálculo da renda per capita conforme prevê o artigo 34, § único do Estatuto do Idoso, que assim preceitua:

Art. 34. Aos idosos, a partir de 65 (sessenta e cinco) anos, que não possuam meios para prover sua subsistência, nem de tê-la provida por sua família, é assegurado o benefício mensal de 1 (um) salário-mínimo, nos termos da Lei Orgânica da Assistência Social – Loas.

Parágrafo único. O benefício já concedido a qualquer membro da família nos termos do caput não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a Loas.

Na seara judicial, os julgados oriundos do Superior Tribunal de Justiça já consolidaram entendimento que o critério de aferição da renda mensal deve ser observado como um limite mínimo, não impedindo outros meios de prova da condição de miserabilidade do postulante, o que vem ao encontro do princípio da dignidade da pessoa humana que bem deveria ser observado quando se trata de benefícios da assistência social.

Dentro ainda dos apontamentos a respeito da exigência de comprovação de renda de ¼ de salário mínimo per capita para efeitos de concessão do benefício assistencial, esta exigência não se mostra crível quando verificamos que o legislador definiu critérios diferentes para a aferição de miserabilidade em relação a outros programas de geração de renda, entre os quais destacamos o Programa de Garantia de Renda Mínima (Lei 9.533/97) e o Programa Nacional de Acesso à Alimentação (Lei 10.689/03).

Os dois programas acima citados diferem do BPC (Loas) no tocante à renda mínima, uma vez que para enquadrar-se para recebimento dos referidos benefícios, necessário que a renda per capita familiar seja inferior a ½ mínimo e não a ¼ do salário mínimo per capita conforme dispõe a Lei Orgânica de Assistência Social – Loas (Lei 8743/93).

Portanto, diante da edição de programas governamentais fixando a renda mínima em ½ salário mínimo, e diante dos entendimentos jurisprudenciais a respeito do tema, há que se rever os parâmetros para aferição da miserabilidade do BPC, sob pena de violação do princípio da isonomia, e da não observância do principal objetivo do benefício assistencial que é erradicar a pobreza e a marginalização, e reduzir as desigualdades sociais e regionais.

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