O artigo Excesso de medidas provisórias desrespeita Constituição, de autoria do presidente da OAB-GO, Miguel Ângelo Cançado, foi publicado na edição desta quinta-feira (4) do jornal Diário da Manhã.
O uso abusivo de medidas provisórias pelo Poder Executivo tem sido, há tempos, duramente criticado pela Ordem dos Advogados do Brasil. A entidade tem convicção do condenável desvio das finalidades originais do instrumento, cujos princípios constitucionais de urgência e relevância têm sido freqüentemente violados.
A banalização das medidas provisórias pôde ser constatada, mais uma vez, em recente votação no Congresso Nacional. No último 26 de setembro, o Senado rejeitou, por 46 votos a 22, a MP nº 377 (de 18 de junho de 2007) que criava a Secretaria de Planejamento de Longo Prazo da Presidência da República, sob o argumento de que a medida não atendia aos princípios constitucionais de urgência e relevância. Obviamente, a derrota no Congresso não foi um empecilho para a Presidência da República, que criará, por decreto, a referida Secretaria para abrigar o filósofo Roberto Mangabeira Unger (PRB). O novo ministério que promete assessorar direta e imediatamente o Presidente da República no planejamento nacional e na elaboração de subsídios para formulação de políticas públicas de longo prazo possui 620 funcionários comissionados. Com a decisão, o governo somará 37 ministérios.
Além de questionável e onerosa para os cofres públicos, a criação de mais um ministério ou tantos outros projetos mirabolantes, ignora inúmeras outras urgentes demandas sociais que ocupam, diariamente, de forma negativa, a mídia brasileira. O interesse individual leia-se partidário – se sobrepõe ao coletivo, que representa, efetivamente, a sociedade, excluindo da lista de prioridades as reformas realmente urgentes para o cidadão, entre elas, a política e a tributária.
Cabe ressaltar, ainda, que o excesso de MPs evidencia o desrespeito do equilíbrio entre os três poderes, à medida que a competência legislativa é retirada do Congresso Nacional. Ademais, a freqüente utilização do instrumento congestiona a pauta de votações. Dados do próprio Senado demonstram que, nos últimos anos, cerca de 60% das sessões plenárias da Casa estiveram trancadas em decorrência da edição abusiva das medidas provisórias.
Recente estudo desenvolvido pelo Conselho Federal da OAB analisa sob a ótica jurídica o uso excessivo de medidas provisórias. O documento, elaborado pelo conselheiro federal da OAB pelo Piauí, João Pedro Ayrimoraes Soares, destaca as origens das medidas provisórias e propõe a revisão do texto constitucional, a fim de adequá-lo à atual realidade. É interessante notar que, à primeira vista, o estudo direciona para decisões radicais, mas revela coerência.
Segundo demonstra o estudo, as MPs foram criadas na perspectiva de que fosse instituído, em 1988, o sistema de governo parlamentarista. Tendo em vista que não foi esse o sistema escolhido em plebiscito, argumenta que a alteração da Constituição Federal é necessária, uma vez que há no presidencialismo a separação rígida de poderes e que muitos abusos são cometidos no Brasil. O texto lembra, ainda, que o ordenamento jurídico vigente também prevê outras formas de provimento legislativo de caráter emergencial que podem ser exploradas. O objetivo é evitar o excesso de edição e reedição de medidas provisórias, que conduz à quebra da independência entre os poderes da República e ao congestionamento do Poder Judiciário.
Constata-se que o uso abusivo das MPs compromete a rápida administração da Justiça e a plena cidadania. Ao mesmo tempo, dota o Executivo de competências do Congresso Nacional, o que ofende o Estado Democrático de Direito. Lutar contra essa afronta dos princípios democráticos consta das finalidades institucionais da Ordem dos Advogados do Brasil, e, mais do que isso, faz parte da atuação cotidiana da entidade.
Portanto, a OAB-GO, mais uma vez, conclama as autoridades a buscarem urgentemente a limitação na edição das medidas provisórias e a observância rigorosa da relevância e urgência, sob pena de inconstitucionalidade. A moralização das medidas provisórias depende do fim da sua desmedida reedição, da extinção do caráter permanente das mesmas e da proibição da diversidade de matérias contempladas pelas MPs, como, por exemplo, no campo do direito penal, processual e tributário.
4/10 9h20