O artigo De que lado está o juiz?, de autoria do presidente da Comissão de Estágio e Exame de Ordem da OAB-GO, Jônathas Silva, foi publicado na edição desta terça-feira (1) do jornal O Popular.
O ato de julgar não se reduz apenas ao automatismo na aplicação da lei. Vai além. É um ato político no sentido grego original desse vocábulo. Portanto, num sentido político, mas não partidário. Todo aquele que julga o faz a partir de sua própria visão de mundo, de sua concepção de direito e de homem. A sentença proferida pode apresentar a estrutura de um silogismo, com suas premissas e conclusão, mas não deve limitar-se à estreiteza de um ato lógico-formal. Toda sentença contém uma dimensão axiológica, imbuída dos valores humanos da justiça, certeza e dignidade. Esses valores fazem com que o direito positivo seja o ensaio de um direito justo.
É por esse motivo que o artigo 5º da Lei de Introdução ao Código Civil demonstra ser atual, quando diz: Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ele se dirige e às exigências do bem comum. Em outras palavras, o juiz não pode ser apenas a boca que profere as palavras da lei, como queria Montesquieu, referindo-se ao contexto do seu tempo, o Estado liberal burguês.
Recentemente, ao decidir um caso concreto, o Superior Tribunal de Justiça proclamou: A interpretação das leis é obra de raciocínio, mas também de sabedoria e bom-senso, não podendo o julgador ater-se exclusivamente aos vocábulos, mas aplicar os princípios que informam as normas positivas (RSTJ, 19/461). Tendo em mente essa diretriz, causa perplexidade a decisão tomada por um juiz de 1º grau de jurisdição de reintegrar ao cargo um delegado de polícia que havia sido demitido a bem do serviço público. A punição fora motivada por desvio de conduta, devidamente comprovado em processo disciplinar, no curso do qual o indiciado teve garantido amplo direito de defesa, observando-se, pois, o devido processo legal.
Em seu pequeno mundo formal, o magistrado fundamentou sua sentença numa alegada inconstitucionalidade do dispositivo da lei estadual e do decreto com que o então governador de Goiás havia delegado competência a seu secretário de Segurança Pública e Justiça para aplicar a pena de demissão. Para tanto, o juiz invocou uma decisão do Órgão Especial do Tribunal de Justiça, cujo acórdão, aliás, ainda não foi publicado e não transitou
Na ânsia de reintegrar o delegado no cargo, o juiz não examinou os vários mandados de segurança que já haviam sido julgados, de forma constante e uniforme, pelo Tribunal de Justiça do Estado. Esses mandados, que somam mais de uma dezena, apresentam decisões semelhantes, que poderiam ser assim resumidas: o secretário de Segurança Pública e Justiça do Estado de Goiás é competente para expedir Portaria, demitindo servidor público, atribuição que lhe foi delegada pelo governador do Estado, nos termos da Constituição Estadual, parágrafo único do artigo 37, combinado com a lei estadual 14.210/2002 e Decreto 5.629/02; entre outros, os mandados de segurança mencionados acima e seus relatores são: 11332-0/101, Gilberto Marques Filho; 10864-5/101, Beatriz Figueiredo; 11798-5/101, Miguel DAbadia Ramos Jubé; 12200-2/101, Juraci Costa; 12301-5/101 e 12483-7/101, Vitor Barbosa Lenza; 13539-1/101, Felipe Batista Cordeiro; 13885-4/101, Carlos Alberto França.
Ao julgar confirmando a legalidade dos atos demissórios do então secretário de Segurança Pública e Justiça, nos casos postos à sua apreciação, o Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, por meio de seus órgãos fracionários, posicionou-se ao lado da sociedade e, mais que isso, realçou o significado do princípio constitucional da moralidade administrativa, como imprescindível à transparência na administração pública.
Esse é o lado da justiça. Não foi, evidentemente, o lado escolhido pelo juiz, ao reconduzir, por força de decisão liminar, o delegado de polícia ao cargo de que fora legalmente demitido.
1/4 – 11h