Artigo: A OAB não é ente estatal

17/10/2006 Antiga, Notícias

 


O artigo “A OAB não é ente estatal” é de autoria do presidente nacional da OAB, Roberto Busato e foi publicado na edição desta segunda-feira, 16,  do jornal Correio Braziliense:


 


“Eça de Queiroz, diante de críticas improcedentes e despropositadas, costumava atribuí-las à má-fé cínica ou à obtusidade córnea de quem as verberava. No caso específico do artigo de Ricardo César Mandarino Barreto, publicado neste suplemento sob o título “As Democracias e os Controles”, atribuo-o a ambas – à má-fé cínica e à obtusidade córnea.


Não há outro modo de entender tantas abordagens primárias, mescladas com afirmações intelectualmente desonestas. Uma delas: a de que a OAB quer viver à margem do controle do Estado. Ou de que não pode ser fiscalizada por qualquer instituição.


Trata-se, como é óbvio, de inverdades – profundas inverdades. Nem que o quisesse, a OAB ou qualquer outra instituição da sociedade civil estaria livre da fiscalização do Estado. O próprio Estado, em suas instâncias mais elevadas, não está imune à própria fiscalização.


A OAB, como todas as instituições classistas – e mesmo todas as outras, classistas ou não -, submete-se às leis do país e a todas as instâncias de controle e fiscalização que o Estado dispõe para aferir e cobrar seu cumprimento: Polícia, Justiça, Receita Federal etc.


Uma coisa, porém, é estar sob o controle social do Estado e outra, bem diferente, é tornar-se um ente do Estado. E é disso que trata, com argumentos tortuosos, o referido articulista.


Menciona a ditadura, mas sugere, na essência de seus argumentos, ter saudades dela. Nada melhor para um Estado autoritário que ter sob seu controle as instituições de classe – sobretudo uma classe como a dos advogados, destemida e intelectualmente preparada para reagir a sofismas e manipulações comuns aos ditadores e a seus apaniguados.


Esse, aliás, é o fundamento do fascismo, o regime das corporações, todas sob o abrigo – e o controle absoluto – do Estado. A OAB não é instituição do Estado. Dele não recebe um centavo. É instituição da sociedade civil, a Casa do Advogado, e é sustentada tão-somente pela contribuição dos advogados.


E é fundamental que assim seja. Os acontecimentos históricos, que o articulista menciona de passagem, buscando minimizá-los em sua grandeza e heroísmo, a partir da citação de outros personagens que dele também fizeram parte, não teriam ocorrido se a OAB fosse um ente do Estado.


Se o fosse, como o quer o articulista, seria possivelmente mais um cabide de empregos de partidos políticos, a gerar despesas para o contribuinte brasileiro e a figurar como mais um penduricalho inútil na vitrine fisiológica do Estado. Inversamente, como ente da sociedade civil, a OAB opôs-se heroicamente às ditaduras do Estado Novo, de 1937, e ao regime militar de 1964. Lutou pelas diretas já e pela Constituinte. Presentemente, sustenta luta sem quartel em favor da ética e da compostura na vida pública.


É, possivelmente, essa luta que tanto incomode o articulista. Com certeza, aos protagonistas dos acontecimentos expostos recentemente em três CPIs do Congresso Nacional – a dos Correios, a dos Bingos e a do Mensalão – interessaria muito mais uma OAB estatizada, sob o controle do governante de plantão.


Por que não se empenha o articulista em estatizar o Conselho Federal de Medicina ou o Conselho Federal de Contabilidade? São entidades análogas à OAB – e que, no entanto, pela natureza intrínseca de suas atividades, não incomodam tanto os estatistas viscerais como o articulista.


Não é verdade que apenas uma decisão do antigo Tribunal Federal de Recursos, de 1951, sustente a independência da OAB. Em 6 de junho deste ano, o Supremo Tribunal Federal, em decisão histórica, reconheceu a autonomia e a independência da OAB ao declarar a inexigência de concurso público para a admissão de seus contratados, reconhecendo ser uma prestadora de serviço público independente, como categoria ímpar no elenco das personalidades jurídicas existentes no direito brasileiro. Repito: 6 de junho de 2006.


O articulista seguramente não desconhece essa decisão da mais alta Corte do país, mas diz, com a maior cara-de-pau, que a independência de nossa instituição sustenta-se em decisão de mais de meio século. Mais uma razão para remetê-lo ao diagnóstico moral com que Eça de Queiroz brindava argumentos tais, de escassa seriedade e baixa consistência. Para dizer o mínimo.”


 


17/10 – 16h30

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