O artigo: A importância da formação é de autoria do presidente da OAB-GO, Miguel Ângelo Cançado e foi publicado na edição de hoje, 27, do jornal Diário da Manhã:
Economista de largo conceito, com esmerada pós-graduação em Educação, o mestre Cláudio de Moura Castro escreveu esta semana na revista Veja: Menos de 20% dos bacharéis em Direito passam no exame da OAB. E daí? Simplesmente não serão advogados. Mas, como em muitos outros países, incluindo a França, o curso de Direito é uma excelente formação geral. Ou seja, Direito é um curso que também forma advogados.
Uma abordagem sensível, num tema relevante, e para uma reflexão muito oportuna. Vou aos números. No primeiro Exame de Ordem aplicado este ano na OAB-GO, no mês de abril, dos 1.996 candidatos que prestaram as provas, 1.255 não obtiveram desempenho suficiente para aprovação. Assim, chegou a 62,88% o índice de reprovação no exame. Um pouco acima, portanto (35,62%), do número mencionado por Cláudio de Moura Castro.
Mas não é isso que muda o rumo da discussão. É mero detalhe, numa situação bem mais delicada e merecedora de estudos acurados. Por que se reprova tanto no Exame de Ordem? Esta pergunta nos é feita diariamente, na OAB e nas nossas atividades profissionais, quando temos que buscar respostas fora de um foco viciado, ou seja, o rigor no exame, antes de uma barreira de mercado, é o ofício de qualificar o profissional do Direito, para que a atividade da advocacia se afirme, como se lhe exigem as nossas regras sociais.
No seu texto, cuja leitura é de se recomendar, Cláudio de Moura Castro propõe outro ponto agudo para uma boa reflexão. Diz ele: Em sociedades modernas, a proporção dos que trabalham na área que corresponde ao seu diploma é cada vez menor. Isso já acontece no Brasil, onde bem menos da metade dos graduados exerce a profissão que está descrita no seu diploma (nas áreas sociais, a proporção cai para um quarto dos graduados). Em suma, o curso superior é uma solução, diríamos, um remendo. O problema está nos níveis anteriores. Reabre-se a discussão: para que vale o diploma de curso superior num país onde impera o desemprego? E o que fazem tantas escolas de nível superior ao formarem contingentes de pessoas despreparadas, e que vão ter mais problema ainda para ingresso num mercado de trabalho estreito, e assim competitivo e cada vez mais exigente?
Da sua parte, a OAB faz o que lhe cumpre. O Exame de Ordem é uma exigência legal desde a edição da Lei 4.215/63. Com o advento do Estatuto da Advocacia e da OAB Lei 8.906, de 4 de julho de 1994 -, o Exame de Ordem se tornou obrigatório para o ingresso nos quadros da OAB, e, por conseqüência, para o legal exercício da advocacia no País. É claro que a Ordem dos Advogados tem que zelar com todo o rigor por esse mandamento legal. O debate sobre o Exame de Ordem e o questionamento a respeito dos seus possíveis rigores é profícuo, na medida em que possibilita o pleno conhecimento da causa real de tamanho quadro de reprovação. A constatação se transforma num outro ponto sensível para a percepção da sociedade, e igualmente merecedor das atenções da imprensa, qual seja a rotina viciosa do bacharel formado sem o mínimo de conhecimento teórico e prático.
Como disse Cláudio de Moura Castro, a advocacia é uma das diversas atividades que o bacharel em Direito pode seguir. Ao se definir por ela, o aluno deve se submeter a um exame específico e demonstrar que possui capacidade profissional para esse fim. É aí que entra o princípio fundamental do Exame de Ordem. Seu objetivo é avaliar todos aqueles que pretendem se dedicar à militância forense e ao exercício da advocacia. Nessa rotina das nossas obrigações institucionais, estamos com inscrições abertas para o segundo Exame de Ordem do Ano, com provas marcadas para 20 de agosto (prova objetiva) e 17 de setembro (prova prático-profissional). Enquanto isso, nos mantemos em ação permanente no incentivo à melhoria da qualidade do ensino jurídico no País, a forma original de chegarmos a um quadro de bacharéis melhor formados.
Consideramos justa, para não dizer natural, a defesa da melhor qualidade do ensino jurídico no Brasil, pela qual a OAB tanto tem se empenhado. Ou não fazem o mesmo as entidades que congregam médicos, odontólogos, engenheiros, arquitetos, agrônomos, médicos veterinários e outras? Estabelecer esse procedimento e encetar, com denodo, esse tipo de luta, em nada depõe contra a OAB. Ao contrário, a engrandece. E a instituição vai persistir nesse caminho, num reforço, aliás, ao compromisso assumido com a sociedade, de zelar para que ingressem no mercado profissionais aptos e capazes e que, no exercício da nobre profissão, o façam com dignidade, grandeza e ética.
Quanto ao mais, é voltarmos ao debate sobre o nível do ensino praticado no Brasil de hoje, e diante da constatação quase unânime de que está ainda muito distante do ideal. Num ano eleitoral como este, nada mau levar esse problema ao topo das discussões. Bom saber que há intenções nesse sentido, e até propostas práticas, como a federalização do ensino fundamental ou a lei de responsabilidade educacional. É problema para os governantes resolverem. E que saibam aqueles que vierem a ganhar as eleições que a sociedade já está na cobrança, inconformada com o baixo nível na formação dos nossos estudantes e com a atrofia daí resultante no quadro dos novos profissionais colocados no mercado de trabalho.