A atuação da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Goiás (OAB-GO) garantiu o trancamento de um inquérito policial que investigava seis advogados sob suspeita de atrapalhar investigações criminais por terem orientado clientes a exercer o direito constitucional ao silêncio durante depoimentos. A decisão foi tomada nesta semana, por maioria de votos, pela Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO), em julgamento de habeas corpus coletivo impetrado pela entidade.
O caso teve origem na Operação Face Oculta, conduzida pela Polícia Civil, que apurava crimes atribuídos a organização criminosa. Durante as diligências, os advogados acompanharam clientes que optaram por não responder às perguntas, o que motivou a instauração de novo inquérito contra os defensores. Para a autoridade policial, essa postura teria configurado tentativa de obstrução da investigação, com base na Lei nº 12.850/2013 (Lei de Organizações Criminosas).
Defesa das prerrogativas profissionais
A OAB-GO, por meio do Sistema de Defesa das Prerrogativas (SDP), atuou na defesa dos advogados, sustentando que a orientação ao silêncio é prerrogativa profissional e garantia prevista na Constituição Federal e no Estatuto da Advocacia. No julgamento do habeas corpus, a Seccional foi representada pelo conselheiro federal Pedro Paulo de Medeiros, presidente da Comissão Nacional de Defesa das Prerrogativas e Valorização da Advocacia do Conselho Federal da OAB.
Em sustentação, Pedro Paulo destacou que as prerrogativas não são privilégios, mas instrumentos de proteção dos direitos da cidadania. “O que se discute aqui é o limite do próprio poder punitivo do Estado. E a resposta constitucional para esse limite sempre foi clara: onde há exercício legítimo da advocacia, o Estado deve respeitar, observar e ouvir. Não se trata de obstruir o Estado, mas de impedi-lo de transbordar os limites que a Constituição lhe impõem”, afirmou.
Ele também lembrou que essas garantias têm dimensão institucional.
“As prerrogativas profissionais não são um favor do Estado ao advogado. São instrumentos institucionais de proteção da cidadania. Não constituem privilégios pessoais. São escudos funcionais que garantem o equilíbrio processual e a efetividade da tutela jurisdicional. Assim como o juiz tem suas prerrogativas, e o Ministério Público tem suas prerrogativas, a advocacia também precisa de proteção, porque é ela quem enfrenta, em nome do cidadão, o Estado e seu poder ilimitado”, pontuou.
Fundamentação da decisão
O redator do acórdão, desembargador Itaney Francisco Campos, destacou que a simples orientação ao silêncio não caracteriza embaraço às investigações, tampouco configura conduta criminosa. Para o magistrado, trata-se do exercício regular da advocacia, assegurado pelos artigos 5º e 133 da Constituição Federal.
O julgamento desacolheu o parecer do Ministério Público, que defendia a continuidade da investigação. Com a decisão, fica determinado o trancamento do inquérito instaurado pela 4ª Delegacia de Polícia de Goiânia.
Direito ao silêncio e defesa técnica
O direito ao silêncio, invocado na origem da investigação, é previsto no artigo 5º, inciso LXIII, da Constituição Federal. O Estatuto da Advocacia, por sua vez, estabelece a inviolabilidade do advogado por seus atos no exercício profissional.
Durante o julgamento, os desembargadores ressaltaram que a orientação ao cliente para permanecer em silêncio não pode ser interpretada como afronta ao poder estatal. Trata-se de manifestação legítima do direito de defesa, protegido pelos princípios do contraditório e do devido processo legal.
Para a OAB-GO, o julgamento consolida o entendimento de que garantias constitucionais e prerrogativas da advocacia são essenciais ao funcionamento da Justiça e à proteção dos direitos fundamentais.