O artigo “Exame da OAB” é de autoria de Deusimar Rolim e foi publicado na edição desta sexta-feira, 9, do Diário da Manhã:
Respeito você nas outras áreas do Direito, mas, no criminal, me considero tão bom quanto qualquer um. Sou criminalista. É o que me disse um modesto advogado, que só Deus sabe quando e onde conseguiu inscrever-se na OAB, depois que lhe neguei uma vaga no escritório. Bem que eu precisava, na época, mas sabia que o valoroso criminalista mal sabia copiar um modelinho de habeas corpus, não redigiria cinco linhas sem dez erros e jamais lera, sequer, a parte geral do Código Penal. E que o mesmo bom Deus livrasse alguém de contratá-lo para uma defesa no Tribunal do Júri!
O Brasil tem mais de 500 faculdades de Direito, 186 das quais só no Estado de São Paulo. Ora, assim como, para o exercício das três outras carreiras básicas da área jurídica (juiz, promotor/procurador e delegado de polícia), o candidato é submetido a longo e complexo concurso público, nada mais justo que, para tornar-se advogado, seja avaliado em sua competência técnica pela instituição responsável pela fiscalização da profissão, a OAB.
Afinal, o advogado intermedia as pretensões jurídicas de toda a sociedade perante o Poder Judiciário, o que representa uma responsabilidade social e profissional enorme. Na medida em que proliferam faculdades de Direito, no Brasil, igual se instalam farmácias em Goiânia, o Exame da OAB surge como penúltima instância garantidora de um mínimo de qualidade nessa intermediação. A última instância, por óbvio, é a própria OAB, em fiscalizando o exercício profissional.
E o Exame não é nenhum bicho-papão. Exigem apenas conhecimentos que deveriam ter sido obtidos nas faculdades, se oferecessem ensino verdadeiro se os estudantes em geral estudassem de verdade. O que predomina, como se sabe, é o conhecido pacto da mediocridade, em que as faculdades fingem que ensinam e os alunos simulam estudar. O baixo nível dos professores (eles próprios, vítimas da gradativa deterioração do ensino, iniciada pela reforma de 1970), a precariedade das bibliotecas e a falta do hábito de leitura, numa cultura eletrônica em que tudo se mediocriza na superficialidade, formam o trinômio da incompetência que envolve graduados, mestres e doutores.
Mais lamentável é saber que a média nacional é ainda mais baixa. Acha-se em curso na Câmara dos Deputados, com a lentidão imposta pelos lobbies dos barões do ensino, projeto de lei do deputado Lincoln Portela segundo o qual as inumeráveis fábricas de diplomas de bacharel em Direito só poderiam realizar concurso vestibular se pelo menos 20% de seus ex-alunos obtivessem êxito no exame da OAB. Excelente idéia, que ensejaria o reaparelhamento das fábricas, digo, faculdades, a melhoria do corpo docente e tempo para que os candidatos a juiz, promotor, advogado e delegado refletissem e, melhor ainda, estudassem.
Não se trata de nenhuma tentativa de garantir uma suposta reserva de mercado. Até que a salutar iniciativa se torne lei, que o aludido Exame vá lhe fazendo às vezes e que a OAB, para o bem da sociedade, lhe preserve o nível.
Deusimar Rolim é advogado, ex-procurador da República, ex-procurador regional eleitoral e escreve às sextas-feiras neste espaço. [email protected]