“Dois pais ou duas mães”, por Chyntia Barcellos

16/08/2012 Artigo, Notícias

Confira o artigo Dois pais ou duas mães, da presidente da Comissão de Direito Homoafetivo da OAB-GO, Chyntia Barcellos, publicado na edição desta quinta-feira (16) do jornal O Popular.

A reprodução assistida é tema atual e de grandes discussões, seja pela classe médica, jurídica e social do País. A infertilidade é considerada hoje pela sociedade médica como um problema de saúde e atinge cidadãos de qualquer raça, cor, sexo, orientação sexual e idade, sendo causa de grande insatisfação e infelicidade humana.

Passados 20 anos da última resolução, o Conselho Federal de Medicina publicou novas normas em 2010 provocando movimentações de toda ordem. Dentre os fatos polêmicos da Resolução n.º 1957/2010 estão a possibilidade de reprodução assistida após a morte e ainda a abrangência dada a todas as pessoas capazes para serem receptoras das técnicas de reprodução assistida. Isso tudo porque na Resolução de 1992, a faculdade era concedida só às mulheres.

E é nesse sentido que a homossexualidade revestida da homoparentalidade ou da dupla parentalidade gravita em meio a essas inovações, reforçando a existência de novos contornos familiares, acolhida recentemente pela decisão do STF de maio de 2011, que deu juridicidade à família homoafetiva.

O Conselho Federal de Medicina inovou e deu cumprimento à Constituição, que assegura o planejamento familiar a todos, independentemente do sexo biológico, orientação sexual, identidade de gênero. Em meio a tantas novidades, já existem casos de reconhecimento judicial tanto da dupla maternidade, como da dupla paternidade.

É certo que as questões biológicas são imperiosas e norteadoras, mas no caso da homoparentelidade a questão afetiva é também tão valorosa e inegável. Para se criar uma criança são necessários dois requisitos mínimos: que os pais ou mães dispensem cuidado, afeto, envolvendo tanto aspectos psíquicos como materiais para o desenvolvimento saudável do filho e ainda é preciso que se invistam na função a ser exercida, comportando socialmente e tendo atitudes compatíveis como tais, características essas que passam longe de muitos pais legítimos, os quais se limitam ao cumprimento de deveres impostos legalmente.

Nesse sentido, é que o caso inédito das goianas Michele e Thaíse ganhou as manchetes de todo o País. O empoderamento e transparência do casal revelando a vontade de serem mães fizeram com que elas buscassem a autorização do Conselho Regional de Medicina para se submeterem às técnicas de reprodução assistida.

Favoravelmente o CFM/GO autorizou a gestação por substituição, onde Thaíse seria a doadora do útero, a Michele do óvulo e o sémen de doador anônimo, envolvendo aí muitos conceitos de parentalidade. Se “é o sonho que mostra o caminho”, nos dias atuais é a Justiça que constrói a direção e mostra que a dignidade humana, o afeto, a igualdade e a liberdade são os bens maiores a serem tutelados pelo Estado, que é laico e deve atender aos anseios sociais, sem ceder às pressões morais.
 
Chyntia Barcellos é presidente da Comissão de Direito Homoafetivo da OAB-GO

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